quinta-feira, abril 29, 2010

palavras de Abril



crónica semanal (às terças) de Anabela Estanqueiro na rádio Hertz

"No passado domingo comemoraram-se os trinta e seis anos da revolução de Abril e o PS de Tomar mais uma vez assinalou esta data com a distribuição de cravos pela zona histórica da cidade. O 25 de Abril de 1974 apanhou-me, na altura, com oito anos e ainda assim guardo desse dia recordações muito intensas, marcadas pelas sábias e claras explicações dos meus pais, que estes sim, terão vivido apaixonadamente a revolução dos cravos.

Para os jovens de hoje é eventualmente difícil imaginar o que era viver no Portugal de há trinta e seis anos, onde era rara a família que não tinha alguém a combater em África, sendo que o serviço militar durava quatro anos, isto quando os militares tinham a sorte de regressar a casa. A maior parte da nossa juventude não imagina nem concebe sequer um tempo e um lugar onde não haja expressão pública de opiniões contra o regime e contra a guerra, onde tudo seja severamente reprimido pela censura, através da força policial. Também não conseguem imaginar que os partidos e movimentos políticos tenham sido um dia proibidos em Portugal, que as prisões políticas tenham estado cheias, que os líderes oposicionistas tenham sido obrigados a exilarem-se, que os sindicatos fossem fortemente controlados, que a greve fosse interdita, que o despedimento fosse facilitado e que a vida cultural fosse apertadamente vigiada.

Com efeito, como escreveu Sofia Barrocas editora executiva da Notícias Magazine, trinta e seis anos é pouco para fazer historia mas é demasiado tempo para a deixar esquecer. A geração que hoje está a chegar ao poder já nasceu depois da revolução que se iniciou com uma canção e que escolheu os cravos como símbolo.

De facto, a juventude de hoje sabe que antes do 25 de Abril não havia projectos Erasmus, nem Bolonha, não se bebia coca-cola nem se comiam hamburgueres do Mcdonald´s por estes lados e que não havia televisão a cores. Mas não sabe que antes do 25 de Abril de 1974, não era permitido escolher livremente um livro para ler e que o acesso a jornais ou a filmes era igualmente limitado. E também desconhece que em Portugal se morria à fome e que só a salto se emigrava para procurar modos mais dignos de vida. Não têm tão pouco noção do estado de insegurança e de angústia em que os portugueses viviam por ver filhos, pais, maridos irmãos e amigos embarcarem para morrer na guerra colonial de Africa ou a sofrerem em prisões, onde eram torturados por suspeita do crime de ter uma opinião.

Que isto suceda a quem já nasceu num país livre, ainda é desculpável, agora o que o que é verdadeiramente desolador, é que aqueles que chegaram a viver este tempo de opressão, se tenham esquecido tão rapidamente que o que hoje é tão banal, como reunirmo-nos para conviver, ou manifestarmo-nos publicamente, partilharmos a nossa opinião ou simplesmente criticarmos a política governamental, tenha sido conquistado com tanta luta por um povo martirizado, explorado, sem voz e sem opinião."
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