sábado, outubro 25, 2008

Súmula da intervenção do Arquitecto Becerra Vitorino na Universidade de Outono

UMA NOVA GESTÃO AUTÁRQUICA PARA TOMAR

O concelho de Tomar possui um potencial único que deveria, pela ordem natural das coisas, colocá-lo em posição de destaque, pelo menos, a nível nacional
Deveria constituir um caso referencial nos domínios do turismo, cultura e património, de entre outros.
Deveria, em consequência, desfrutar de confortável solidez económica

Que razões me levam a dizê-lo?
Tomar possui uma cidade histórica com um traçado ímpar e de particular importância que é apontado como modelo utilizado para a baixa Pombalina.
Possui um rio que, sem desprezo pela sua beleza natural em toda a extensão, apresenta no seu atravessamento na cidade, um dos mais belos trabalhos de engenharia hidráulica, cuja importância é potenciada por estarem relacionados com o Infante D. Henrique, figura maior da História de Portugal.
Possui uma riqueza patrimonial ímpar marcada por elementos relevantes desde a pré-história até à revolução industrial.
No domínio do património construído, é difícil encontrar uma corrente artística que não esteja condignamente representada nesta cidade ou neste concelho.
No que respeita ao legado arqueológico industrial, de uma riqueza e diversidade imensas, os domínios de estudo e valorização ainda se encontram por explorar.
Tem uma história multicultural, onde marca presença a Sinagoga, segundo monumento mais visitado.
A galeria de figuras históricas e culturais ligadas a Tomar é de uma riqueza invejável.
E, claro, acima de tudo, tem o legado patrimonial e cultural da Ordem do Templo que hoje, nem é preciso dizê-lo, vem adquirindo grande relevância em todo o mundo.

Poderia desenvolver muito mais a exposição das nossas riquezas.

Mas, para o caso presente basta o que foi exposto para que repita a pergunta que todos fazem:
O que é que tem falhado?

Porque é que em Tomar não se tirou partido do nosso potencial, quando outros concelhos o fizeram partindo de uma posição menos favorável?

O Partido Socialista tem como propósito central recuperar desta situação injusta e angustiante para os cidadãos.
Promover de forma eficaz e consequente o conceito Templário.
Promover o sector turístico orientado para diferentes mercados com particular incidência no turismo cultural.
Recuperar uma vivência urbana de qualidade para residentes e visitantes.
Aumentar os níveis de serviço e qualidade do ordenamento do território e a mobilidade.

Afirmar-se como pólo cultural em diversos domínios. Sendo a relevância óbvia “A Ordem do Templo”, dar também especial incremento à cultura musical de entre outros domínios a explorar.

A disponibilidade de espaços recuperáveis para funções culturais existe, bem como existe a necessidade urgente de promover a recuperação de um património construído a caminho da ruína.

Território, Cultura, Economia e Sociedade, são os grandes temas em que é necessário intervir.
Em todos estes domínios, intimamente interdependentes, o Partido Socialista quer e deve intervir para bem dos cidadãos e do Concelho de Tomar.


Quanto a ideias e projectos, devo dizê-lo sem entrar em modéstias falsas, que ao longo dos últimos anos, os representantes autárquicos do Partido Socialista têm produzido ideias e propostas em todos os domínios de acção.

A terem sido consideradas, o que não aconteceu, estaríamos, em Tomar a dar passos seguros com vista a uma melhor qualidade de vida para os cidadãos.
Quanto a oposição construtiva, temos desempenhado o nosso papel com determinação e entrega.


De entre as diversas razões para o insucesso da actual gestão PSD da autarquia tomarense, destacarei hoje uma para analisar mais em detalhe.

A minha partilha convosco vai centrar-se numa breve reflexão sobre a forma de objectivar uma gestão autárquica que procure níveis de articulação satisfatórios com a sociedade civil.
Ocupar-me-ei do domínio das relações do poder local com a população, bem como da participação da mesma nas decisões que lhe dizem respeito.
Não caberá nesta simples exposição uma solução exacta para o problema, irei, contudo, apoiar-me em casos práticos e experimentados pelo Partido Socialista em Tomar.

Todos nós, cidadãos comuns, ao entregarmo-nos à actividade política enfrentamos um paradoxo:
Constituindo-se o exercício político num forte sentido de cidadania e entrega à coisa pública, na prática, somos confrontados com alguma perda de prestígio perante os nossos pares, pois ficamos sujeitos a um estereótipo estabelecido por grande parte da população em relação à chamada “classe política”.

Sobranceria, cinzentismo, falta de imaginação ou até de cultura, etc.
Não vem a propósito esboçar em mais detalhe este retrato, mas creio que a confrontação que a tal “classe política” experimenta, periodicamente, com uma atitude abstencionista muito expressiva em toda a sorte de eleições, não nos permite ignorar a extensão deste fenómeno
Claro que não é a perda de qualidade aparente que nos deve preocupar, mas antes as consequências que tal facto encerra na busca de uma gestão, no caso, autárquica, verdadeiramente eficaz porque alicerçada num construtivismo social em constante interacção
Uma acção política que, em lugar de impor ideias, muitas vezes destinadas ao insucesso, saiba fazer a síntese de um sentimento colectivo em relação ao meio em que se insere, às suas necessidades à sua história e aos seus objectivos.

Mesmo que, numa primeira análise, este propósito possa parecer utópico.
Mesmo que não haja soluções claras para este problema, aborda-lo não será certamente tempo perdido.
Parece-nos uma reflexão urgente e necessária numa sociedade moderna, não no sentido estético que configura o modernismo, conceito já ultrapassado.
Mas numa sociedade em que o arquétipo do desenvolvimento pelo desenvolvimento há muito deu lugar à busca de uma modernidade menos expansionista, mas pelo contrário, mais inclusiva e mais sustentável.
Mais baseada no potencial humano que no esgotar de recursos.

As supostas grandes visões, de que falei atrás, quando alheadas da realidade circundante estão condenadas ao insucesso e caem, deixando, no processo, muito para recuperar.
O poder local é aquele que deve ser mais reactivo em função das circunstâncias que em cada momento configuram e caracterizam uma sociedade no lugar e no tempo.

Por deformação técnica posso afirmar que não se cria a partir do nada, não se consegue erguer uma obra coerente a partir de um qualquer devaneio imaginativo individual, bem pelo contrário, os melhores projectos são aqueles que conseguem descobrir a riqueza de um contexto difícil, de um conjunto de condicionantes, são aqueles que conseguem tirar partido das limitações para encontrar a solução.
A verdadeira imaginação não se confunde com a fantasia, surge do real e acrescenta-o, valoriza-o, sem o negar.

Deverá ser assim, também, na gestão de uma autarquia

Tomar sofre hoje as consequências da falta deste princípio.
Apesar das supostas grandes ideias, temos hoje um concelho envelhecido, deprimido e empobrecido.
Tudo isto apenas pelo afastamento que o poder autárquico demonstrou em relação à realidade envolvente.
Perdoem-me por não me poder alhear da realidade do concelho de Tomar.

O que deve fazer o poder local para contrariar este estado de coisas?

Portugal, fazendo jus a uma democracia consolidada, tem um quadro legislativo favorável a este propósito.
Toda legislação que tem vindo a ser produzida no domínio da regulação entre os órgãos autárquicos e a população apontam num caminho de aprofundamento da acção participativa, ou seja da democracia directa em sentido lato.
Orçamento participativo
Ordenamento do território participativo
etc.
Tudo está previsto e ao dispor

Apontando para o tema que desenvolverei, o ordenamento do território, basta analisar o esquema a que deve obedecer o processo de execução e aprovação de um PDM para concluir que a gestão participada do assunto pode ser conseguida se assim se desejar.
Neste esquema, existem:
Sete indicações relativas a actos de divulgação pública
Três momentos dedicados à participação directa
Obrigações acrescidas no caso de se verificarem observações da população que apontem no mesmo sentido, em número superior a vinte
Trabalho de comissões legalmente constituídas – Comissão Mista de Coordenação


Então porque não funciona, como tem acontecido em Tomar?
Vejamos dois exemplos, como disse, do domínio do ordenamento do território

Flecheiro
O Partido Socialista, ao tomar consciência de um desmesurado volume de construção que a Câmara previa para a margem do rio, promoveu debates, esclarecimentos, em suma, divulgou um documento que apesar de se encontrar em discussão pública, se encontrava encerrado nos gabinetes, pois nem havia cartas actualizadas para consulta da população.
A participação dos cidadãos, em fase legal de discussão pública foi muito significativa, tendo-se levantado uma forte contestação ao projecto. - Mais de Mil pessoas assinaram individualmente a nossa proposta de alteração.

O resultado foi nulo, a resposta da autarquia foi inexistente
Não foi alterada uma linha do que estava proposto em consequência da intervenção popular
Ou seja, a população manifestou as suas ideias e convicções e o poder ignorou-as.


Quanto ao PDM
O Plano Director Municipal de Tomar encontra-se em fase de revisão (há vários anos).
A Câmara Municipal inclui um pequeno capítulo na sua incipiente página da internet dedicado ao PDM, cumpre, pelos mínimos, o dever de informar, não sobre as linhas orientadoras do plano, como acontece em muitos outros concelhos por esse país, mas tão-somente sobre o facto de o estar a rever.
E qual é o resultado agora?
A população não participa!


A equipa técnica que tem desenvolvido o projecto elaborou um inquérito de perfil à população, amplamente distribuído com a factura da água
Resultado: menos de 3% da população respondeu e devolveu
Uma indiferença de 97%, e ninguém dá sinais de preocupação

Desta vez, o respeito que a população do concelho nos merece, levou-nos a empreender uma acção pedagógica.
Tal acção competiria a quem detém a condução da autarquia, mas não o fez nem creio que pense fazê-lo.

Pode concluir-se que os órgãos autárquicos, quando mal geridos, rejeitam esta participação popular, quer de forma activa, quer de forma passiva.

Continuamos, em Tomar, a viver num ambiente em que o acesso à informação é dificultado por todos os meios e com o auxílio de cumplicidades que não escondem o desejo de partilhar uma fatia do poder.

A uma Câmara Municipal compete ter uma atitude clara, uma acção pedagógica e uma real sensibilidade ao meio envolvente.
Deve incluir seriamente nas suas decisões a síntese opinativa da população.
Tomar é um caso paradigmático de mau servir e que é urgente alterar.

É necessária uma acção empenhada neste domínio
Essa acção deve assentar em dois pilares
Pedagogia
Participação

A Pedagogia
Deve promover uma cultura de defesa do interesse colectivo
Deve demonstrar que esse interesse colectivo é uma parte do interesse individual entendido numa perspectiva de solidariedade intergeracional
Deve demonstrar a justeza e necessidade dos seus projectos
Deve respeitar culturas e singularidades locais
Deve respeitar a memória colectiva

A Participação
Deve ser encarada sem restrições ao acesso ou à opinião
Deve ser promovida com a mesma visibilidade utilizada para a promoção do poder instalado
Deve ser consequente

É com esta forma de actuar que pretendemos num futuro próximo vir a dar voz às iniciativas privadas.
Criar condições para a melhoria da qualidade de vida dos Tomarenses.
Numa palavra: Recuperar o prestígio do Concelho de Tomar
Disse